Global Commissioner Sir Richard Branson in Diario de Noticias: “Portugal preserves the dignity of people who use drugs”

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Richard Branson: “Portugal preserva a dignidade de quem consome drogas”

A atual visão sobre como se lida com os consumidores de droga tem de ser alterada, defendem 26 altas individualidades, como o antigo Presidente da República Jorge Sampaio. Estados têm de intervir para regulamentar mercado e não de reprimir, acrescentam.

“Portugal tem sido, nos últimos anos, o melhor exemplo de como se pode lidar com o consumo de drogas. O seu modelo preserva a dignidade das pessoas que consomem, o bem-estar e a segurança de todos os membros da sociedade. No entanto, a descriminalização do consumo [prevista no país desde novembro de 2001] deve agora evoluir”, ou seja, pensar na intervenção do Estado para a legalização das drogas.

O elogio à forma como Portugal tem lidado com a questão do consumo e posse de estupefacientes nos últimos anos a que juntou um pedido de mais ação, é feito em declarações ao DN por Richard Branson, o empresário fundador da Virgin e um dos defensores de políticas menos repressivas nesta área. Ou seja, apoia modelos idênticos ao que Portugal tem seguido desde 2001 e que está mais vocacionado para os alertas sobre os eventuais danos do consumo e para o tratamento dos toxicodependentes. No nosso país, quem for detetado pelas autoridades com uma determinada quantia considerada para consumo pode ser multado e encaminhado para uma equipa de tratamento.

Branson faz parte, tal como o antigo Presidente da República Jorge Sampaio, de um grupo de 26 antigos altos dirigentes mundiais que integram a Comissão Global de Política sobre Drogas, entidade que esta tarde apresentou em Lisboa um relatório com uma visão política sobre o tema. No documento com o título “Classificação de Substâncias Psicoativas: Quando a Ciência foi Deixada para Trás” defende-se que o mundo tem de alterar a forma como lida com a questão das drogas passando da atual visão maioritária de repressão para uma postura de apoio e tratamento.

E é no caminho da regulação por parte do Estado que vão as declarações de Richard Branson ao DN quando refere a forma como o nosso país tem encarado esta questão e o que tem de acontecer no futuro. “A Comissão Global de Política sobre Drogas acredita que Portugal tem agora experiência e provas suficientes para avançar para o próximo passo. As políticas públicas, mesmo as mais inovadoras, devem ser revistas e adaptadas para atender às necessidades de evolução. Talvez seja a hora de começar a pensar em como o Estado pode retirar o mercado das drogas ilegais das mãos dos criminosos e apoiar os mais vulneráveis, que muitas vezes se envolvem no mercado negro por falta de outras hipóteses.”

Esta defesa da intervenção dos Estados no sentido de legalizarem o consumo de drogas é expressa no relatório de meia centena de páginas que foi divulgado na tarde desta terça-feira na Câmara Municipal de Lisboa pela presidente da Comissão, a ex-presidente da Confederação Suíça Ruth Dreifuss, acompanhada por vários ex-presidentes da República – por exemplo, Jorge Sampaio (Portugal), Fernando Henriques Cardoso (Brasil), César Gaviria (Colômbia), José Ramos-Horta (Timor-Leste e Prémio Nobel da Paz) – a ex-alta-comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos Louise Arbour e os Nobel da Paz Mohamed ElBaradei (ex-diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atómica) e Juan Manuel Santos (antigo presidente da Colômbia).

Neste trabalho agora conhecido defende-se que a atual classificação de drogas – em oito listas de acordo com o potencial de dependência – está ultrapassada além de que “é fundada em preconceitos históricos e sociais e influenciada por interesses políticos, comerciais e culturais, ao invés de se basear numa avaliação científica do potencial de dependência ou dado”.

Os membros deste órgão independente pedem que os países deixem de pensar as políticas relacionadas com as drogas numa vertente “influenciada pela ideologia e a obtenção de ganhos políticos” e passem a tomar decisões assentes em “investigação e revisão científica”.

Defendem que as “substâncias psicoativas deveriam ser classificadas de acordo com o seu potencial de dependência e outros danos. Não é isso que hoje acontece, dado que algumas substâncias estão legalmente disponíveis por serem consideradas benéficas (medicamentos) ou culturalmente importantes (álcool), enquanto outras são vistas como destrutivas, sendo estritamente proibidas”.

Na apresentação do relatório surge uma frase do antigo Presidente da República Jorge Sampaio que frisa: “Este relatório oferece novas perspetivas científicas sobre as drogas. Põe em causa a classificação internacional de drogas, mostrando a pouca ou nenhuma correlação com a avaliação científica dos seus malefícios.”

Para Jorge Sampaio, “um sistema de classificação de drogas baseado na investigação, que não crie estigmas, pode fazer toda a diferença, influenciando e orientando as pessoas para que façam opções mais responsáveis e menos prejudiciais. Recorrer à investigação científica para avaliar os danos causados pelas drogas é, sem dúvida, o caminho a seguir”.

Tese idêntica tem o dono da Virgin. Richard Branson diz ao DN que a Comissão defende que “os governos tenham uma estrutura legal para gerir os riscos [do consumo], que proteja os menores e que faça que os consumidores saibam o que estão a usar e que sejam bem informados sobre os reais danos das substâncias. Foi isso que fizeram o Canadá e o Uruguai com a canábis, exemplos que a Nova Zelândia e o Luxemburgo vão seguir. E é importante que a legalização seja discutida a nível global. Não podemos permitir um sistema global dividido numa parte em que o Ocidente resolva os seus problemas de procura de droga pela via da legalização e o resto do mundo continua a utilizar a repressão”.

Branson lembra que se deve defender “os indivíduos e as suas vulnerabilidades” e critica os cinco países com direito de veto no Conselho de Segurança da ONU – China, Estados Unidos, França, Rússia e Reino Unido – por “continuarem ferozes defensores da proibição [do consumo] apesar de alguns deles já estarem a pagar um preço alto por essa abordagem, como os EUA com a crise de overdoses e a crise de VIH na Federação Russa”.

Perante estas posições mais humanistas, a Comissão defende no documento que “a comunidade internacional tem de reconhecer a incoerência e as inconsistências existentes no sistema de classificação internacional e deve iniciar uma revisão critica dos modelos atualmente aplicados na categorização das drogas”, que se deve “priorizar o papel da Organização Mundial da Saúde e da investigação interdisciplinar no desenvolvimento de outros critérios de classificação com base na evidência científica e numa escala racional de danos e benefícios” e que os “Estados membros das Nações Unidas devem centrar novamente o sistema de classificação internacional no seu ímpeto original de controlo do comércio transnacional, permitindo o desenvolvimento de sistemas inovadores de classificação nacionais”.

Pedem ainda aos países que facilitem o uso destas substâncias agora ilegais para fins médicos e de investigação; que se abandone as políticas de tolerância zero para dar mais espaço a “outros fins legítimos”; que mostrem mais abertura relativamente a substâncias menos nocivas; que se tenha em consideração circunstâncias culturais e sociais locais, que se faça análise de custo-benefício dos potenciais danos e dos presumíveis benefícios; e aceitem alguns limiares de risco.